quarta-feira, 22 de agosto de 2018

Efervescência

        Eu a conheci por acaso, aquele verão nos envolveu numa louca onda de calor, nos encontrávamos sempre que possível, as horas viravam minutos e a maré de sua voz doce colidia ferozmente contra meu temperamento seco e arenoso. Ela ria das minhas antigas frustrações, das minhas piadas sem graça, e até da minha mania de mudar de assunto quando deixava escapar algo fofo, sim, chorava na mesma intensidade quando me via triste, dopado de remédios e com os olhos sem vida e opacos, como um manequim, nunca foi minha intenção que ela ficasse mal, não por mim, mas a vida é bem clara a respeito disso, quase tudo que acontece no final das coisas independe da nossa vontade.
      Numa noite qualquer nós nos esquecemos do tempo, silenciamos os celulares, e rasgamos a cidade, eu mostrei os lugares aonde ia para escrever, onde ia odiar o que tinha escrito, e onde me afogava em bebida enquanto lamentava nunca chegar onde queria, claro, também o meu refúgio, onde olhava o céu cheio de estrelas, onde as palmeiras dançavam com o vento, nos beijamos violentamente, sem preocupações, mas quando o sol ameaçou nascer, eu resolvi leva-la para casa, mesmo que nosso fôlego não tivesse morrido.
     - Você sabe dizer o que sente por mim, João? - Disse ela.
     - Eu gosto de passar o tempo com você, mas não sei o que sinto. E quanto a você? - Respondi.
     - Sei sim, exatamente, e é justamente isso que tanto me assusta.
        Nunca soube nomear sentimentos, é como tentar definir uma sinfonia inteira em apenas uma nota, não cabe, explode como o som da nossa pele que se choca entre os lençóis, transborda como suas lágrimas naquele filme bobo, ou em alguns casos apenas definha, até que você percebe que tudo que sobrou foi o silêncio. E o silêncio eu não posso permitir, não importa se somos amantes eternos ou só um romance de verão, eu nunca poderia suportar ser o responsável por silenciar sua alma, e repentinamente me dar conta que sou apenas mais um cara num bar sem nada a dizer, com uma mulher ao meu lado de braços cruzados e olhar tedioso.

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