segunda-feira, 30 de maio de 2016

Considere-se morto, o ar fica bem mais puro.

            Entre um gole e outro de mais uma garrafa de catuaba quente eu tinha um novo ataque de tosse, tampava a boca com a metade da mão que a blusa não cobria, o céu nublado, aquele vento gelado incessante que passava por trás da casa e se convertia num urro infernal, a tosse entre mais um gole da bebida ou um trago no cigarro, isso soaria tão poético se não fosse pela total falta de significado que tem quando se olha de um jeito cru.
             Não tem nada de especial na cena, não tenho o coração partido, nem feridas expostas, não estou triste pela primeira vez em um bom tempo, embora ainda ache que tudo soa como bosta, então comecei a pensar em como aqueles objetos, aquele clima, tudo remetia a solidão, em como nos cercamos de sinais e representatividade afim de "romantizar" o que sentimos, e sobre como ter domínio sobre esses sinais te dá o poder de moldar como as pessoas te veem.
              Então o que transforma um ator de bosta em um grande astro? O grande astro pode sentir o momento, não importa se é verdade, não importa se só o cenário carrega o sentimento, ele vai sentir de qualquer forma, mesmo sem motivo, todos somos atores principais no nosso ponto de vista do mundo, na forma como enxergamos a vida, você é o astro da sua novela, do seu filme, nossa vida, nossas lembranças são apenas um compilado de cenas que protagonizamos. Você tem feito por merecer o papel? Ou só abaixa a cabeça enquanto as cenas passam? Esse filme não tem reprise amigo, pare de romantizar e viva.





Ps. Em algum lugar do futuro você já está morto, como quer preencher o caminho que levou até esse momento?
           

segunda-feira, 2 de maio de 2016

Não seja o pequeno príncipe, foda-se a rosa.

          Me despedi com um abraço frouxo e virei as costas, olhei a rua que se estendia na minha frente até sumir no horizonte, engoli seco, saliva e todas as palavras que eu gostaria de ter dito e ficaram entaladas na garganta. Um cachorro abanava o rabo próximo da esquina, começou a me seguir, como se entendesse que tudo que eu precisava naquela naquela noite onde o vento gelado castigava a pele, era uma boa companhia.
          Andei pelas ruas da cidade sem destino certo, era a minha atividade mais frequente ultimamente, quando meus pés arderam me sentei em uma calçada suja, acendi um cigarro, soprei a fumaça no focinho do cachorro que rosnou baixo em tom de desaprovação e em seguida se deitou em meus pés. O som calmo e melancólico que só The Smiths tem ecoava no meu fone de ouvido meio estragado e fazia aquela cena se tornar digna de um Tumblr qualquer feito por um adolescente revoltado.
           Peguei meu celular e então comecei a ler os status das pessoas, todas aquelas frases tristes e apaixonadas, toda aquela liberdade e amor próprio que as meninas exibiam no status enquanto no mundo real se prestavam a qualquer coisa, os garotos com frases subliminares sobre como estão se sentindo sozinhos, querendo não demonstrar como o sexo masculino é frágil e abalável, muito mais do que as mulheres pensam.
            Soprei fumaça no focinho do cachorro mais uma vez, depois outra e mais outra, a reação era sempre a mesma um leve rosnado em seguida o perdão e uma lambida leve na perna. No final é isso que estamos fazendo não é? Todos nós, perdoando pequenas ofensas de pessoas que mal conhecemos e esperando um afago por menor que seja, somos uma geração doente, de pessoas carentes que só se sentem bem com companhia, não importa o efeito colateral.
              Em relação a pessoas criadas lendo uma obra doentia sobre dependência como pequeno príncipe, não poderia esperar mais, aceitamos qualquer merda desde que tenhamos um buraco quente em que nos enfiar a noite.